Luís Andrade de Sá – DHLAKAMA

por Arsenio Reis

 

Afonso Macacho Marceta Dhlakama, moçambicano, 61 anos, acaba de perder a sua quinta eleição. Até aqui, e para o confortarem, os seus correlegionários costumavam apontar os exemplos de Lula da Silva, que teve três eleições perdidas antes de ser eleito Presidente do Brasil, ou de François Miterrand, que passou por duas derrotas até chegar ao Eliseu. Mas Dhlakama já não tem mais eleições para perder.

Com a vitória de Filipe Nyussi, 56 anos, da Frelimo, e a ascensão de Daviz Simango, 50 anos, do MDM, partido que domina três das cinco principais cidades do país, a política em Moçambique rejuvenesceu, com pessoas já de uma geração que não tem experiência direta nas guerras que dizimaram o país entre 1962 e 1992. É tempo de Afonso Dhlakama entregar a direção da Renamo aos jovens talentosos que tem no seu partido, e que não são poucos, e dedicar-se a um papel de senador, que não existe na política moçambicana, mas ao qual ele tem direito.

Nos últimos anos estive com Afonso Dhlakama por diversas vezes. Entrevistei-o na sua moradia discreta na rua Filipe Samuel Magaia, em Nampula; depois, numa casa de adobe no quartel general que montou na Gorongosa; e, antes, tinha passado um fim de semana alucinante a segui-lo nos confins da província de Quelimane, conduzido por dois ex-guerriheiros da Renamo que se irritavam quando se falava mal do Sporting. Eram dias de Ramadão numa província muito islâmica, Dhlakama chegava já de madrugada e bastante atrasado às perdidas povoações mas ninguém arredava pé para o ver – e ele, como se não fosse nada, falava durante horas e o programa ia ficando cada vez mais atrasado.

Vendo-o, a dançar marrabenta ou a esbracejar na caixa aberta de uma Toyota, era impossível não se pensar no chavão “big man”, com que o jornalismo internacional identifica os senhores da guerra africanos, e quase sempre acrescentando-lhe uma ironia: “Big men, little people”.

Dhlakama teve responsabilidades diretas na terrível guerra civil que destruiu Moçambique, foi cúmplice de ações do apartheid e do regime branco da Rodésia e até os seus amigos da Internacional Democrática do Centro, de que foi um dos vice-presidentes, como Barroso e Aznar, preferiram sempre o diálogo com a Frelimo. Isolado pela direita mundial, ostracizado na região, Dhlakama teve ainda força para voltar ao mato e, pelas armas, impor à maioria da Frelimo uma importante revisão da lei eleitoral, que era profundamente injusta e a cujas artimanhas a comunidade internacional fechava os olhos. Como ele respondeu a críticas que lhe foram dirigidas pelos americanos, com uma lei eleitoral idêntica à que vigorava em Moçambique, Barack Obama nunca teria sido eleito…

A lei mudou e esse é o legado que Dhlakama deixa a Moçambique, se não enveredar outra vez pela guerra, contra o que considera a “fantochada” das eleições. Para isso , é importante que Afonso Dhlakama se mantenha em Maputo, na sua residência da avenida Julius Nyerere, e que a Renamo, que agora elegeu mais deputados do que há cinco anos, assuma a sua condição de partido parlamentar, e não de movimento de antigos guerrilheiros. A eleição para a Ponta Vermelha de Filipe Nyussi, um “jovem” sem o passado da luta armada da Frelimo, é também uma boa oportunidade para uma mudança mais geral de atitudes na política moçambicana.

 

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