GOA, DAMÃO E DIU PODIAM SER PLATAFORMA PARA A LUSOFONIA

por Arsenio Reis

 

Nova Deli podia aproveitar os seus três territórios que formaram a ex-Índia portuguesa, como a China aproveitou Macau, para servirem de plataforma comercial para os países lusófonos, defende Sharoz Permemcar, que dirige o Núcleo de Animação Cultural de Goa, Damão e Diu. Em entrevista ao Plataforma Macau, o responsável salienta que a ocupação dessas zonas formou uma comunidade em Macau a partir do fim da década de 1960, hoje já enraizada e que conta mesmo com um deputado eleito pela população no hemiciclo local.

 

PLATAFORMA MACAU Como descrevemos a comunidade de Goa, Damão e Diu em Macau?

SHAROZ PERMEMCAR – A comunidade de Goa, Damão e Diu começou a formar-se em Macau por causa da invasão desses territórios, que levou muita gente a fugir de lá, nomeadamente no fim dos anos 60, início dos anos 70. Algumas pessoas foram para Portugal, outras para Moçambique e algumas vieram para Macau. A comunidade está hoje espalhada pelo mundo, há, por exemplo, muitas pessoas de Damão em Inglaterra, também há muitos goeses em Portugal – o atual candidato do PS a primeiro-ministro de Portugal António Costa é goês – e uma parte destas pessoas ainda estão em Macau.

Alguns vieram para Macau talvez pela proximidade geográfica, mas muitos foram mandados, já que trabalhavam para a administração portuguesa. Hoje em dia, a comunidade não é tão grande como no passado, muita gente já faleceu ou regressou a Portugal na altura da transferência [do exercício de soberania de Macau para a China].

Temos aqui hoje talvez cerca de 100 pessoas. Podemos dizer que a maior parte dos membros da comunidade são originários de Goa e depois de Damão.

 

P.M. A comunidade criou raízes em Macau ao longo destes anos? 

S.P. – Sim, há pessoas das gerações mais recentes que criaram aqui família com chineses e macaenses e também com pessoas de outras nacionalidades. Eu, por exemplo, já nasci em Macau. O meu pai mudou-se para cá depois da invasão de Goa.

Mas muitas pessoas ainda vão de férias uma vez por ano para visitar a família em Goa, Damão e Diu. Eu, por exemplo, ainda tenho família em Goa, tios, primos, tenho muita família lá.

 

P.M. A que atividades se dedica a comunidade?

S.P. – A maior parte dos membros é formada por funcionários públicos. Temos arquitetos, médicos, advogados, gente de vários setores. E temos um deputado [Pereira Coutinho], que é mais um caminho para nos afirmarmos, para mostrar que a nossa comunidade sempre esteve dedicada a Macau e que somos aqui aceites. Ele tem-nos ajudado, mas é muito difícil fazê-lo sozinho. Por exemplo, este ano pedimos uma audiência com o chefe do Executivo para saber se nos podia ajudar a arranjar uma sede, que ainda não conseguimos, mas não nos recebeu.

 

P.M. Que papel tem tido a comunidade em Macau?

S.P.  – A comunidade tem tido um papel ativo no desenvolvimento de Macau. Continuamos a fazer o nosso trabalho, a demonstrar as nossas capacidades e vamos continuar.

Mas há um pormenor que temos de ter em consideração. A enorme transformação de Macau faz com que as pessoas fiquem um pouco aborrecidas com o que se está a passar, por exemplo, as questões da habitação, o custo e a qualidade de vida, que não tem nada a ver com o que já vivemos, e talvez isto leve pessoas a pensar se vale a pena continuar aqui ou se é melhor ir embora.

 

P.M. Quando e porquê foi criado o Núcleo de Animação Cultural de Goa, Damão e Diu?

S.P. – Esta associação foi criada há uns seis ou sete anos para manter a nossa cultura viva em Macau, divulgando-a, por exemplo, na Festa da Lusofonia e outras atividades. Neste momento temos cerca de 80 membros e tentamos, dentro das nossas possibilidades, organizar atividades, sobretudo de convívio. E também organizamos uma vez por ano uma viagem para termos mais tempo para convivermos e trocarmos ideias.

Gostávamos de fazer mais coisas, mas temos todos o nosso trabalho e, por vezes, não há tempo para fazer muita coisa. Mas gostávamos de trazer mais artistas de Goa a Macau para fazerem algumas demonstrações culturais, mas é muito difícil, porque também não temos apoio financeiro.

 

P.M. O que têm planeado para a Festa da Lusofonia deste ano?

S.P. – Estamos a pensar apresentar uma amostra de um mercado de Goa. Vamos trazer alguns produtos de Goa para as pessoas terem a oportunidade de provar. Já fizemos isto no ano passado e foi um sucesso e este ano vamos dar continuidade. Vamos trazer também um grupo de música e cantares de Goa. Este grupo vai apresentar músicas tradicionais de Goa e algumas músicas portuguesas antigas que eles continuam a preservar.

 

P.M. Goa, Damão e Diu continuam a conseguir preservar a sua diferença na Índia?

S.P. – É como Macau, vai-se integrando pouco a pouco cada vez mais na Índia, mas há pessoas que ainda continuam a preservar a cultura de base portuguesa, mas espero que, com a ajuda do Governo, consigam manter esta cultura viva. Julgo que depois da organização dos Jogos da Lusofonia de Goa, as pessoas reviveram um pouco aquele bichinho português do passado.

 

P.M. Como vê hoje a ligação de Goa, Damão e Diu à lusofonia? 

S.P.. – Por aquilo que tenho ouvido, acho que as pessoas em Goa, Damão e Diu querem recriar a ligação com a lusofonia, mas tudo depende do Governo da Índia. Mas parece que estão a ponderar esta situação de recriar ou reforçar os laços entre a Índia e os países de língua portuguesa, porque também é uma vantagem para eles. Espero que seja tomada uma decisão nesse sentido.

Tal como Macau foi designada como uma plataforma para os países lusófonos, eu também acho que o Governo da Índia podia aproveitar muito bem Goa, Damão e Diu para também criar uma plataforma, nomeadamente para negócios, entre a Índia e os países de língua portuguesa, porque a Índia já começou a ser um país de manufatura, por isso, para continuar a ter esta economia a funcionar, tem de começar a criar laços com o exterior. Existe este potencial, porque Goa, por exemplo, é completamente diferente do resto da Índia, mas tudo depende do Governo da Índia, se quer ou não.

 

P.M. Existem muitos empresários de Goa, Damão e Diu a explorar esta plataforma de Macau?

S.P.– Não, a maior parte da comunidade é formada por funcionários públicos, há poucos membros dedicados aos negócios.

 

Patrícia Neves

 

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