Após dois protestos de rua, que surpreenderam pela sua dimensão, o Chefe do Executivo anunciou ontem que retira o diploma do regime de benefícios para quem tenha exercido altos cargos políticos em Macau. Em nome de uma “vasta auscultação dos diversos setores da sociedade e um maior consenso social”, diz o comunicado oficial emitido ontem.
Na sequência de uma reunião extraordinária do Conselho Executivo, “foi considerado que a proposta constitui uma parte importante e imprescindível para a construção institucional do sistema político da Região Administrativa Especial de Macau. No entanto, tendo em atenção que a mesma tem sido alvo de grandes divergências no seio da sociedade e tem ainda espaço para melhoramentos, é necessário auscultar a opinião pública e mais tempo para estudo e análise, com vista a uma maior consensualidade”, diz a nota governamental.
A decisão surge no final de uma semana de tensão política, marcada pelo duplo protesto de rua contra a proposta de lei dos subsídios vitalícios para quem termine o exercício de altos cargos políticos, diploma que previa ainda a imunidade do Chefe do Executivo. Perante a dimensão da marcha que percorreu o centro da cidade, o Chefe do Executivo, Fernando Chui Sai On, pediu logo à Assembleia Legislativa que suspendesse a votação do diploma, reconhecendo a “preocupação elevada dos cidadãos” e entendendo haver “espaço para aperfeiçoar a proposta”.
Essa decisão não abortou contudo um segundo protesto, na terça-feira, em frente ao parlamento, onde a votação do diploma, na especialidade, foi substituída por outra: o diploma foi congelado, à espera de uma nova versão, mas não foi liminarmente retirado. Decisão que surgiu ontem. “Na reunião do Conselho Executivo “foi ainda considerado que a base de obtenção do consenso social consiste na consulta da opinião pública, acreditando-se que ele será possível com o empenho do Governo, da Assembleia Legislativa e dos diferentes setores da sociedade e análise de forma aprofundada e aberta das diversas opiniões e sugestões, para em conjunto se constituir o tal sistema”, diz o comunicado que anuncia a retirada formal da proposta de lei.
DOIS PONTOS POLÉMICOS
O debate durante a semana centrou-se em dois pontos polémicos diretamente ligados à proposta de lei:
– A diferença entre os subsídios vitalícios para os titulares dos principais cargos políticos recrutados no setor privado e os valores atribuídos a quem ascende ao Governo a partir de uma carreira levada a cabo na Função Pública. Segundo a proposta do Executivo, a compensação é calculada com base em 30% da remuneração mensal auferida à data da cessação de funções, para quem tenha um currículo construído no setor privado; já para antigos funcionários públicos, o cálculo da remuneração é de 14% da remuneração mensal auferida à data da cessação de funções;
– A imunidade parlamentar já existe para os deputados, que não podem ser investigados a não ser que a Assembleia levante a imunidade a pedido do Ministério Público. Por outro lado, os argumentos contrários à extensão desta prerrogativa ao Chefe do Executivo centraram-se nas dúvidas sobre quem levantaria a imunidade, no caso do líder do Governo, uma vez que, formalmente, este não é nomeado pela Assembleia, mas sim pelo Governo Central.
Nas e nas redes sociais multimplicaram-se comentário relativos a outros temas que terão contribuído para a dimensão duas manifestações; nomeadamente, o aumento das rendas de casa, a inflação e a alegada falta de transparência da governação. Oficialmente encabeçada por associações como a “Consciência de Macau” e a Associação Dos Trabalhadores da Função Pública, o protesto varreu as redes sociais e tomou proporções inesperadas. Os organizadores falam num dos maiores protestos de sempre em Macau, alegando terem estado entre 15 a 20 mil pessoas na marcha de domingo. As autoridades contabilizaram cerca de sete mil. Na manisfestação de terça-feira, à porta da Assembleia Legislativa, terão estado cerca de cinco mil pessoas.
古步毅 Paulo Rego