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Vivian Yang – CUI JIAN: o Pai do Rock Chinês

O pai toca trompete, a mãe dança folclore coreano. Aos 20 anos CuiJian é trompetista profissional, mas o instrumento que o pai ama não é a sua verdadeira paixão. As cassetes que ouve abrem-lhe as portas para a música estrangeira, enrolando-o no rock androll. Do estudo da guitarra passa à escrita musical e, rapidamente, atua em bares e restaurantes.

Na década de 80 transforma-se na estrela da cultura alternativa e no farol da modernidade chinesa.

 

A fama chega em 1986, quando canta “Nada em meu nome (一无所有)” na televisão. Juntando instrumentos como o oboé e a flauta de bambú chinesa à música eletrónica, Cui Jian conquista a juventude urbana com uma musicalidade inovadora e de grande impacto.

O seu estilo não tem precedentes e a sua banda a que dá origem – ADO – é a primeira a assumir na China as rédeas do rock androll.  O Diário da Juventude de Pequim não poupa tinta em elogios e anuncia a mudança de paradigma: “A música pop chinesa não terá nada em seu nome depois de ´Nada em meu nome´, de Cui Jian”.

 

“Quero dar-te os meus sonhos/e a minha liberdade

Mas tu sempre te ris de mim/Sem posses em meu nome”

 

Bob Dilan e os Beatles têm influência. A poética de Cui Jian é feita de versos livres que transmitem a sensação de tristeza. Introspetivo, defensor do sexo e da natureza humana, diverge da estética superficial do pop da época. Mas não faltam os sons da cultura milenar chinesa. A crítica descobre na música de Cui Jian a influência do cancioneiro popular do noroeste chinês, rico em conteúdos lúdicos e subjetivos. Cui Jian recusa a etiqueta, nunca se explica. Considera-se um puro intérprete do rock, faz a música que quer.

Quando em 1989 atua na Praça Tiananmen, a sua música é vista como um hino do protesto estudantil. Não tem conteúdo propriamente político, mas as letras inspiram o interesse na liberdade.

O amor da juventude tem consequências. Poucos anos depois perde o acesso aos grandes palcos chineses e, gradualmente, a fama esboroa-se. Mas Cui Jian continua. Na década de 90 publica dois álbuns muito aclamados, lança vários singles e atua em vários países.

Num país dominado pela ideologia do proletariado, onde a arte e a cultura eram ainda oprimidas pela agenda política, a música de Cui Jian é sentida como um apelo à liberdade. Mas as letras não contestam o regime, nem as lideranças políticas. Numa controversa entrevista chega a elogiar a MaoZedong, criticando a geração à qual pertence por estar perdida e não ter objetivos. Os mais velhos, sustenta eram resolutos e focados: “Pelo menos, a vida deles tinha um objetivo”.

 

A IMAGEM DOS ANOS 80

 

Em 2005 regressa com um novo álbum, “Quem é Cui Jian”, um sucesso estrondoso que traz de volta aos palcos de Pequim – 12 anos depois – com o concerto “O sonho debaixo do Sol”. Já não é o jovem de outrora, mas o espírito do rock está vivo e não desilude os seus fãs. Afinal, continua a ser o ícone que inspira a sua geração. E prova que pode influenciar as seguintes.

O crítico de música JinZhaojun segue desde sempre a carreira de Cui Jian, descrevendo-o como “o eterno insatisfeito”. O espírito dos  camponeses e do proletariado está-lhe gravado na memória, nunca pára de se revoltar, de criticar, de ser intransigente com tudo, com todos, e consigo mesmo. É o espírito da década de 80, a idade da reforma, quando juventude perdida no caos que marca os seus pais luta para se encontrar a si própria e um novo mundo. Na música “Não é que não entenda (不是我不明白)” Cui Jian evoca a “geração perdida”:

 

Nas acções do passado, confundo o certo e o errado/ O tempo passou, eu não me lembro do tempo.

O que outrora achei simples, agora não compreendo/ Subitamente sinto que o Mundo em frente aos meus olhos não é aquele em que estou.

 

Confusão, paradoxo, caos aparentemente interminável. Mas a vida continua e o tempo tudo leva. Cui Jian expõe a angústia que confunde a juventude. Não é senhor da cura, antes brilha pela coragem de a expressar em voz alta.

O rock ainda hoje resiste como cultura alternativa, Cui Jian eterniza-se como a estrela que guia as outras que vão nascendo, como que a lembrar-lhes que vale a pena lutar. Escava nas pessoas a fome e o desejo de viver, a beleza da natureza humana; como um trovão, desperta corações silenciados; como um soco no estômago, desafia as ideias antigas com o poder das emoções; como uma rocha, resiste ao tempo com a paixão pelo rock que nunca se altera.

 

DA MÚSICA AOS FILMES

 

A estreia como realizador de cinema é recente merece toda a atenção. Há quem diga que a estrela do rock se prepara para abandonar a música, com medo de ser incapaz de superar os feitos do passado. Mas “O Osso Azul (蓝色骨头)” mostra que Cui Jian rock nunca estão longe um do outro.

O personagem principal, um jovem cantor underground, ganha a vida à margem da lei. A audácia é o espelho da memória da sua mãe, primeira hippy na China, nos anos 70. A paixão dos protagonistas pela música e a trama familiar interligam-se com a visão do realizador sobre o seu próprio percurso. O espírito de rock androll é omnipresente e actor principal projeta o espírito da depressão, à imagem e semelhança de Cui Jian. Os filmes, diz no seu papel de realizador, são outra forma de comunicar com as novas gerações, transmitindo a identidade cultural e musical que construiu enquanto músico.

Elementos políticos à parte, o filme centra-se nos sentimentos, na liberdade de expressão e, sobretudo, na força da música. O respeitado website italiano de crítica cinematográfica, “SentieriSelvaggi”, sintetiza assim a obra: “Ficamos obstinados a abandonar a lógica, a ordem, o equilíbrio e a clareza, em nome da pura emoção, como se apenas o barulho, o volume e o som vindos do filme fossem o princípio e o fim de tudo”.

Com estreia em Roma, “O Osso Azul” tem já vários prémios em festivais de cinema chineses e internacionais, incluindo o Prémio Especial do Júri da 8ª edição do Festival de Cinema de Roma. Coube ao realizador Zhang Yuan, grande amigo de Cui Jian, explicar a escolha: “Ele é o grande cantor chinês de rock androll e usou a sua coragem para fazer um filme único”.

Vivian Yang

 

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